Continuação por Verônica....
Saindo do pequeno embaraço de Clara, peguei um copo descartável, coloquei um pouco de café e caminhei até meu irmão. Ele me lançou um olhar rápido e, ao perceber que Clara estava por perto, voltou-se para ela:
— Clara, você ficará com o Bruno para ajudá-lo a embalar e organizar as prateleiras do freezer… — começou.
Engoli um gole de café rápido demais e, inevitavelmente, engasguei. Uma tosse súbita me dominou, arrancando olhares surpresos.
— Tudo bem pra você? — meu irmão perguntou, inclinando-se levemente, o olhar cheio de preocupação.
Clara apenas assentiu, segurando o copo de café com um cuidado quase teatral, e eu mal pude deixar de notar o jeito que ela o segurava, como se fosse a coisa mais preciosa do mundo. Um pequeno detalhe, talvez, mas que me arrancou uma risadinha interna.
— Tudo bem, só… — tentei falar entre uma tosse e outra — apenas bebi o café rápido demais.
Ele franziu levemente a testa, ainda preocupado, enquanto eu já me recompunha, tentando recuperar a compostura.
Enquanto me acalmava, percebi Clara me observando de canto de olho, talvez com um misto de curiosidade e divertimento. Aquela simples situação — café, engasgo e risadas contidas — parecia ter transformado o galpão em palco de pequenas tensões engraçadas, sem que ninguém precisasse dizer uma palavra sobre o que realmente acontecia.
Voltei a respirar normalmente, segurando o copo com mais cuidado, e, por um instante, o silêncio entre nós três ficou apenas carregado de pequenas olhadas, gestos e distrações engraçadas. Nada explícito, nada declarado — apenas um momento leve, curioso, que deixava claro que Clara e eu ainda estávamos descobrindo algo uma sobre a outra, sem pressa, apenas observando.
Ao voltarmos para o mercado, encontrei a equipe já com a mão na massa — ou melhor, nos frios. E, claro, meus olhos foram direto para Clara.
Ela estava no açougue, ocupada com as tarefas que meu irmão havia designado: embalando os frios fatiados, pesando-os e organizando nas prateleiras do freezer. Cada movimento seu parecia eficiente e concentrado, mas eu me peguei observando cada gesto com uma atenção que não era totalmente consciente. A inclinação, a forma como ajustava os pacotes, até a maneira como o cabelo caía sobre o ombro… era quase obsessivo, e eu nem sabia direito por quê.
Pelo visto, os dois estavam se dando muito bem. Bem demais, para meu gosto. Observá-los interagindo de forma tão natural, com Clara rindo discretamente das piadas do Bruno e ajustando o trabalho com facilidade, me provocava uma mistura de desconforto, diversão e aquela curiosidade silenciosa que ainda não sabia bem como nomear..
Enquanto caminhava pelo espaço, tentando manter a postura de supervisora, percebi que qualquer gesto simples de Clara — uma inclinação, uma risadinha ou o modo como ajustava os pacotes — tinha o poder de tirar meu foco completamente. Eu me pegava lembrando de detalhes que provavelmente ninguém mais notaria, absorvendo cada pequeno movimento como se fosse parte de um quebra-cabeça que eu ainda não sabia decifrar.
Era engraçado e estranho ao mesmo tempo. Clara estava ali, fazendo seu trabalho, sem nenhuma consciência do efeito que causava em mim. Nada explícito, nada declarado… apenas uma observação quase obsessiva, curiosa, que me fazia rir por dentro enquanto tentava parecer séria para os demais.
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