CAPÍTULO 2
Por Verônica...
Dois dias se passaram desde que vi Clara naquele restaurante. E, desde
então, não consigo tirar da cabeça o comportamento daquela garota. Fascinante.
Tenho trinta e quatro anos e, sinceramente, nunca vi alguém da geração
atual reagir com tanta maturidade após passar por uma humilhação — ainda que
por engano. Clara não se vitimou, não se exaltou. Apenas se manteve firme... e
isso me intriga.
Agora, tenho duas opções claras diante de mim: ou a demito, por
precaução — já que, se quisesse, ela teria provas mais do que suficientes para
nos processar por assédio moral — ou a cultivo. Sim, lapido essa menina até
torná-la ainda melhor do que já demonstrou ser.
Não posso me basear em um único comportamento, eu sei. Mas não é só
sobre o que ela fez — é sobre o que ela representa. Não sei se o que estou
sentindo é admiração ou um tipo de alerta instintivo... talvez os dois. Só sei
que Clara despertou algo. Agora, cabe a mim decidir em qual direção isso vai
evoluir.
Depois dos três dias de folga que concedi aos funcionários, hoje é o dia
em que todos retornam às suas funções — e, com isso, me darão suas respostas
sobre permanecer ou não na equipe. Aos que decidirem ficar, farei o possível
para recompensá-los dentro do que os fundos do mercado ainda permitem. Não será
fácil, mas quero que sintam que, a partir de agora, alguma coisa vai mudar.
Meu objetivo é encontrar pessoas verdadeiramente comprometidas com o
trabalho. Ao mesmo tempo, quero remover tudo — e todos — que estejam atrasando
o progresso desta empresa ou se aproveitando da inexperiência do meu irmão.
Providencio um carro para mim — não consigo acompanhar o ritmo do meu
irmão. Sou mais ansiosa que o normal.
Chego ao mercado antes de qualquer um. Logo depois, o gerente aparece, e
em seguida, Clara. Nos cumprimentamos de forma breve, apenas o básico. Sem
troca de palavras além do necessário.
Pouco tempo depois, percebo Clara colocando uma panela com água para
ferver. Silenciosamente, ela prepara café. Um gesto simples, mas inesperado.
Ela se aproxima, com um leve rubor nas bochechas e os olhos evitando
contato direto.
— Verônica... eu fiz café. — disse, um pouco tímida. — Se quiser, está
disponível na cozinha.
Lhe retribuo com um olhar cheio de gratidão pela informação, e apenas
assinto. Não era o café em si que me tocava, mas o gesto — discreto, gentil,
vindo de alguém que poderia ter todos os motivos do mundo para me ignorar.
Sem palavras, ela volta para seus afazeres, e eu permaneço ali por
alguns segundos, absorvendo o peso daquele pequeno gesto.
Alguns minutos se passam e, com uma planilha em mãos contendo todas as
novas diretrizes da gestão que pretendo implementar, saio da sala em direção ao
salão principal. Reúno os funcionários e peço que, pelo menos hoje, cheguem
trinta minutos antes do horário de abertura das atividades. Explico, com
firmeza e clareza, que hoje precisarei da colaboração dos dois turnos — manhã e
tarde — para iniciar as mudanças estruturais e operacionais que considero
urgentes. É o primeiro passo para colocar este mercado de volta nos trilhos.
Ao ver todos reunidos — alguns com copos de café nas mãos, que presumo
ser o que Clara havia preparado —, tomo um momento para observar. Assim que
percebo que tenho a atenção de todos, dou início.
— Bom dia a todos! — digo, com a voz firme o suficiente para alcançar
cada canto da sala.
— Hoje apresento a vocês as diretrizes da nova gestão. — Alguns começam
a me olhar com estranhamento, talvez até desconfiança, mas mantenho minha
postura.
— A partir de hoje, todos que fizerem horas extras serão devidamente
compensados, seja com folgas ou com a possibilidade de saírem mais cedo,
conforme o volume e a necessidade do dia. Isso é o mínimo de justiça que posso
garantir nesta nova fase.
Vejo alguns rostos expressando indignação com a nova proposta, mas sigo
em frente, sem dar margem para objeções precipitadas.
— A partir de hoje, só será necessária a dobra de turno em casos de
movimento extremo. — faço uma breve pausa, olhando cada um nos olhos. — Caso
contrário, o gerente presente será o responsável por cobrir a ausência de
qualquer funcionário, seja no caixa, seja como repositor.
Nesse momento, meu olhar se fixa em Augusto, que imediatamente entende a
mensagem. Não era uma sugestão — era uma ordem.
Vejo em Clara um olhar misto de alívio e preocupação, o que me deixa um
pouco confusa — mas não o suficiente para perder o foco.
— Voltando ao assunto das dobras: a partir de hoje, só será feita a
dobra de turno se o funcionário estiver de acordo, sendo avisado com, no
mínimo, três horas de antecedência.
Percebo a expressão de desaprovação no rosto de Augusto e, antes que ele
possa dizer algo, continuo:
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