Pagina 07 – Capitulo 01.
Por Verônica....
Ao ouvir o que aquela funcionária disse sobre os abusos sofridos
aqui no mercado, eu fiquei sem palavras. Completamente sem palavras. Vê-la
saindo dali como culpada por algo que agora é responsabilidade minha desestruturou
todos os meus argumentos. Então percebo que o erro está muito além de maus
funcionários; está na maneira como são tratados.
Sem reação, chamo a atenção de todos ali presentes e comunico algo que,
talvez, se meu pai estivesse vivo, nunca aconteceria.
— O mercado ficará fechado por três dias. — Vejo a reação de espanto no
rosto de todos, inclusive do meu irmão. — Esses três dias serão abatidos no
banco de horas de vocês.
Percebo o alívio de uns, mas a frustração de outros também. Por isso,
solto o verbo para todos escutarem.
— Se alguém tiver algo contra, que me comunique imediatamente! — Vejo o
arregalar de olhos de alguns e a fúria no olhar de outros. — A partir de hoje,
a gestão deste mercado muda. Podendo ser favorável para uns e desfavorável para
outros. Vocês decidem!
É agora ou nunca. Não irei mais nutrir funcionários ruins punindo os
bons. Essa gestão horrenda acaba agora. Peço um papel em branco e uma caneta ao
gerente; ele, sem pestanejar, logo me traz o que preciso.
— Preciso do contato de cada colaborador presente, inclusive o da
funcionária que acabou de passar por aquela porta. E daqueles que não estão
presentes também. — Digo de maneira séria e direta. — Apenas o primeiro nome,
função, o número e o turno já são suficientes.
Ao ver o primeiro funcionário pegar a caneta da minha mão, o vejo
assinar rapidamente todos os dados que pedi — e assim foi com o próximo, e o
próximo. Pego o papel em minhas mãos e vejo que alguém adicionou o número
dos que não estão presentes. E o da Clara.
— Bom, meu intuito em ter o contato de vocês é porque quero conhecê-los.
Vejo algumas reações suspeitas, o que é normal, já que duvido que a
maioria das empresas queira ter esse contato.
— Irei fazer um grupo, onde direi algumas novas regras sobre o emprego
de vocês, porém tudo dentro da lei que protege cada direito do trabalhador. —
Com olhos e ouvidos atentos, tenho mais uma vez a atenção de todos.
— Teremos uma reunião formal no dia em que voltarem às atividades
normais aqui no mercado. — Sinto que, mesmo colocando as cartas na mesa, alguns
colaboradores ainda estão insatisfeitos.
— E digo mais: se alguém entre vocês não estiver de acordo com nada que
for imposto sobre a função de vocês, iremos dispensá-los, cada um com seus
devidos direitos. Sem mais, nem menos.
Olho para aquele homem que se diz gerente deste mercado. Minha expressão
séria e minimalista indica o quão egocêntrico e egoísta ele parece ser, agindo
sempre em benefício próprio. Não é um defeito ser assim — mas agir dessa
maneira com pessoas honestas, cujo único motivo é levar o sustento para casa,
jamais.
Errei ao subestimar aquela garota, insinuando sua falta de
responsabilidade com o emprego. Percebi que ela foi apenas mais uma vítima de
um sistema manipulador, onde se paga um único salário a uma pessoa e se exige
que ela exerça duas, três funções a mais — como foi o desabafo dela há pouco.
Não quero seguir adiante com uma gestão tão cruel assim. Por mais que eu
não devesse me preocupar com isso neste momento, no fundo me importo. São
pessoas sendo maltratadas por um sistema em que o governo atual não quer apenas
a sua mão de obra, mas também lucrar em cima dos seus salários — os famosos
impostos. Corrigirei meu erro com aquela menina — isso se ela não estiver,
neste exato momento, contratando um advogado para nos processar por assédio
moral.
Aquela garota parece ser meio marrenta, e quanto ao humor irritante...
nem se fala. Mas, no momento em que deixou claro que vestia a camisa desta
empresa sem ganhar nem um centavo a mais — e, pelo visto, ganhando muito menos
do que em qualquer outra empresa aqui em Caldas Novas —, tudo mudou. Não
significa que gostei da maneira como ela me abordou, mas, naquele caso, eu
mereci ser tratada daquela forma. Agora, preciso ter uma reunião com o
responsável por aquele abuso ter tomado a proporção que tomou: o Igor.
Nessa turbulência toda, não vi meu irmão abrir a boca para dizer uma só
palavra. Com um olhar atento a tudo e a todos, o que talvez lhe reste seja
mesmo o silêncio.
Próxima página - O acaso a meu favor
Nenhum comentário:
Postar um comentário