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segunda-feira, 13 de outubro de 2025

O acaso a meu favor - Página 66

Por Clara…

Depois do almoço, regado a conversas paralelas e muitas risadas, acabei optando por passar o intervalo no escritório dela. 

Por pura curiosidade — e talvez por querer estender um pouco mais aquele momento — pedi que me explicasse o que significavam aqueles gráficos coloridos na tela do computador.

Ela riu, daquele jeito divertido e um tanto incrédulo, como quem não esperava tal pergunta. Mas, ainda rindo, colocou os óculos de grau, e ali… minha respiração vacilou.

Era algo simples, quase banal, mas ver Verônica ajeitando os óculos e inclinando-se sobre a tela, com aquele ar de concentração e a voz firme, foi o suficiente para bagunçar meus pensamentos.

Tentei me concentrar no que ela dizia — afinal, fui eu quem pediu a explicação —, mas era difícil. Cada gesto dela, cada pausa breve entre as palavras, parecia um convite para me perder um pouco mais.

No pouco tempo que tínhamos, e dentro do que ela podia me ensinar, explicou tudo de forma tão paciente que até os números fizeram sentido.

Por isso você vê o Augusto o tempo todo ranzinza. — disse, finalizando a explicação com um sorrisinho de canto.

A forma como ela falou me arrancou uma risada, e por um instante, nossas vozes se misturaram no ar — leves, cúmplices, perigosamente próximas.

Depois da risada, um silêncio confortável se instalou — desses que não pesam, mas que fazem o ar parecer mais denso.

Verônica ainda olhava para a tela, mas seus dedos batiam distraídos sobre a mesa, como se o pensamento dela já tivesse ido para longe… ou, quem sabe, para perto demais de mim.

Eu observava o reflexo dela no vidro da tela — o contorno do rosto, a curva discreta dos lábios. Tudo nela exalava uma elegância que me deixava sem saber se devia admirar ou fugir.

— Conseguiu entender agora? — perguntou de repente, virando-se para mim.

O olhar dela me pegou de surpresa. Por um instante, esqueci completamente o que estávamos fazendo ali.
Meu coração pareceu bater mais alto que o som do ventilador da sala.

— Acho que sim… — respondi, um pouco sem voz.

Ela inclinou o corpo para frente, apoiando o cotovelo na mesa e o queixo sobre a mão, me analisando com aquele olhar que parecia ler o que eu não dizia.
Senti o rubor subir pelas bochechas, e Verônica, ao perceber, arqueou levemente a sobrancelha, um meio sorriso brincando nos lábios.

— Você fica vermelha quando mente, sabia? — disse em um tom provocante, quase sussurrado.

Sorri, sem coragem de negar.
E, por alguns segundos, ficamos ali — uma frente à outra — com o som do ar condicionado e o barulho distante da pessoas no mercado sendo a única testemunha daquele quase-acontecimento.

Entre risos e pequenas provocações, o tempo passou sem que eu percebesse. Verônica, que até então parecia relaxada, começou a me lançar perguntas curiosas — dessas que misturam curiosidade e algo mais profundo.

Eu, claro, me divertia com isso. Respondia algumas, deixava outras no ar, só pra ver o modo como ela franzia o cenho quando não obtinha o que queria.
Ver Verônica perder um pouco do controle, mesmo que por segundos, era… uma das minhas cenas favoritas.

— Mas então… — ela começou, entortando ligeiramente a boca, tentando disfarçar o incômodo sob um tom quase casual.

— Aquela mulher que veio aqui mais cedo… — pausou, e pude jurar que escolhia as palavras com cuidado, como quem anda por terreno perigoso. — Vocês se conhecem há muito tempo?

Dei de ombros, fingindo indiferença.

— Já teve, ou tem alguma coisa… ainda? — completou, tentando soar natural, mas a tensão em sua voz entregava tudo.

Por dentro, eu queria rir. Por fora, tentei manter o ar mais neutro possível — mas é difícil conter o riso quando se vê Verônica, a mulher mais fria e contida que conheço, tropeçando nas próprias palavras por… ciúmes?

A olhei de relance, e por um instante ela desviou o olhar, como se tivesse dito algo que não deveria.
Seu rosto estava sério, mas os dedos tamborilando levemente sobre a mesa a traíam.

— “Ainda?” — repeti, fingindo surpresa, arqueando uma sobrancelha. — Está me fazendo um interrogatório, dona Verônica?

Ela soltou o ar lentamente, entre um riso nervoso e um suspiro irritado.

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